domingo, 13 de março de 2011

Animação Cultural: Olhar Extra muros (parte II)

Livro do Congresso de Animadores Culturais, Aveiro - Portugal, 2010. 

O pesquisador português Bruno Calheiros define a animação cultural como:

“uma forma de educação não formal, aberta às necessidades da comunidade, cuja dinâmica participativa vai determinar de que maneira a interação social acontece, numa ação sociopedagógica que visa o despertar da razão e a tomada da consciência do indivíduo para as transformações sociais individuais, coletivas e nos conflitos de interesses”.
            A reificação do indivíduo patrocinado pela indústria cultural, que o descaracteriza como sujeito próprio e o condiciona cada vez mais, à posição de objeto, é evidenciado na ausência de afeto nas relações sociais, não permitindo uma tomada de consciência do ser coletivo. Inevitavelmente, a escola será a grande responsável pela sua difusão, evidenciada na maneira como trata todo seu conteúdo programático, que como colcha de retalho fragmentada e desconexa, é imposta para ser decorada, sem qualquer possibilidade de reflexão.  A escola ao se apropriar destes conteúdos, os retransmite sem permitir a novas perspectivas e novos olhares.
            Numa tentativa de legitimar o escopo da indústria cultural, a escola acaba por reproduzir o mesmo modelo totalizante responsável pela homogeneização de hábitos, costumes, crenças e pensamentos da sociedade contemporânea. Será neste contexto que a animação cultural encontrará seu campo de batalha e, consequentemente, seus maiores desafios. Partindo do pressuposto de que a animação cultural tem por função primária a mediação dos bens culturais e, que esta não acontece sem a intervenção necessária junto às estruturas da sociedade a que ela se dispõe, é necessário que rompamos com os velhos preconceitos que ecoam ainda no país que concebem como função de animador cultural a caricatura de recreadores e festeiros de plantão, sempre descontextualizados da realidade.
            A experiência de uma nova síntese educacional inaugurada com os Centros Integrados de Educação Pública (Cieps), nas décadas de 80 e 90, por Darcy Ribeiro, fracassa no momento de seu nascedouro quando a escola tradicional/tecnicista não reverbera seus conceitos pedagógicos e não permite a manutenção de suas práticas construtivistas.
            Numa relação marcada pelas desigualdades sociais e manipulação da classe dominante (aqui se lê classe média) a escola pensada por Darcy não poderá ser permitida, pois ela só existe como possibilidade real de reequilibrar a balança, permitindo que o filho da pobreza tenha acesso á Educação, e Educação de qualidade.
            Um movimento perigoso no tabuleiro de xadrez das relações sociais, onde os filhos do Brasil não se poderiam sentar a mesma mesa e participar do mesmo jogo. Xeque mate. Perdemos mais uma vez o bonde da história. Um hiato de quase três décadas entre a escola darciliana e as famigeradas cotas universitárias, estas existentes tão somente como ações compensatórias pela covardia que praticamos num passado recente, condenando pelo menos duas gerações á marginalidade em todos os seus aspectos.
            Tais relações só acontecem mediante a construção de esquemas simbólicos de pensamentos capazes de costurar e organizar a realidade de acordo com o jogo de interesses da classe dominante.

“o jogo do real como algo abstrato, a partir do momento em que o indivíduo preso as teias de pensamentos, recebe pressão externa do grupo que apresenta como ‘realidade’ somente aquilo que é socialmente aceito como real.” (Kurt Lewin)

            Ou seja, a “realidade” não é absoluta, ela se diferencia muito de acordo com as relações sociais vivenciadas pelo indivíduo junto ao grupo de que participa.
            A organização e valoração dos objetos simbólicos do real se dão a partir dos esquemas lingüísticos e intelectuais apontados por Whorf capazes de determinar o grau de importância a ser apreendido pelo indivíduo, que absorve estes esquemas, na maioria das vezes, de forma inconsciente. Elegemos a escola como ferramenta operacional de interpretação destes símbolos e, damos a ela o poder de classificar o universo das obras filosóficas, literárias e artísticas culturais a serem assim apresentadas.
            Para Bourdieu a escola não cumpre apenas a função de consagrar a “distinção” entre os signos e seus significados, do que ele denomina como “classes cultivadas”. No seu entendimento, a cultura que a escola transmite tem o poder de separar os que a recebem do restante da sociedade, a partir de um conjunto de diferenças sistemáticas, determinando os conceitos de cultura, cultura erudita, cultura popular e cultura de massa. 
Wilson  Heidenfelder
Presidente-fundador do CEACDarcy
(extraido do livro do Congresso de Animadores(a) Animação Sociocultural - Profissão e Profissionalização dos Animadores - Aveiro. Portugal, 2010)

Nenhum comentário:

Postar um comentário